15/03/2011

O Silêncio dos Inocentes - Terremoto no Japão

Com muito custo resolvi escrever sobre a calamidade que se instaurou aqui no Japão desde o dia 11 de março, às 14:50 da tarde.
Eu estava em casa, trabalhando, quando comecei a me sentir enjoada e tonta. Levou alguns segundos para que eu me desse conta e olhasse para os lustres, que estavam balançando.
Ao contrário de todos os outros terremotos que já senti por aqui, este não tremeu janelas e portas. Veio em silêncio, como se quisesse sacudir apenas meu corpo internamente.
Durou pouco. Passou. E como de hábito, liguei a tv e coloquei na NHK para ver aonde tinha acontecido o abalo, que até então era para mim apenas mais um.
Quando vi que havia sido no nordeste, uma região muito distante daqui, e que até então, a tv o denominava como 8.8, senti que a coisa tinha sido feia.
Foi aí que a realidade se mostrou de uma forma nunca antes ousada pela minha imaginação.
Como se não bastasse ver aquelas imagens devastadoras e até então inéditas aos olhos do mundo, presenciei em questão de minutos a forma física de uma palavra que até então, tirando a tragédia da Indonésia, só conhecíamos por aqui dos manuais de conduta em caso de calamidades sísmicas: o tsunami.
Assisitia aquilo com  uma mistura de pavor, incredulidade, compaixão e desespero. Ao mesmo tempo, tirava várias fotos da tv, que depois postarei aqui.
Meu instinto materno era o que mais gritava nessa hora, pois foi bem no horário em que as crianças do primário saem da escola. Detalhe: Aqui, as crianças vão e voltam em grupos para casa e para  a escola, sem a presença de adultos.
Quero acreditar dentro de mim que o tremor tenha ocorrido antes de que alguma criança já houvesse saído da escola. Assim, elas seguiriam o treinamento e ficariam nas dependências da escola, que é o primeiro local de abrigo, a espera de seus pais.
Mas daí vem outra coisa que me angustia. Quantos pais foram tragados junto com seus carros e seus bebês pequenos presos nas cadeirinhas de segurança enquanto iam até as escolas buscar seus filhos maiores...
Quantos foram pegos de surpresa, e não tiveram a mínima chance de correr para lugares mais altos, de sair de dentro dos carros, dos barcos, das fábricas, das casas...
O choque aumentava a medida que via carros sendo levados como se fossem de brinquedo. Barcos com pescadores dentro sendo tragados pelos redemoinhos, containers sendo jogados a quilômetros de distância como se fossem peças de playmobil, navios sendo arrastados cidade a dentro.
E depois dos gritos de desespero, dos pedidos de socorro, das sirenes de alerta, do som da fúria das águas; veio o silêncio.
O silêncio dos inocentes que se foram  junto com a onda e que provavelmente nunca serão encontrados.
O silêncio da dor imensurável por tudo o que os olhos nos obrigam  a ver sem querer acreditar no que está acontecendo.
O silêncio do desespero nos olhos de quem perdeu tudo e todos e que não sabe o que fazer daqui pra frente.
O silêncio do papel com o pedido desesperado de mães clamando por notícias de suas crianças que sumiram na hora do desastre.
Num primeiro instante, esses foram os sentimentos.
A ausência de notícias pelo blog foi dada ao congestionamento de todos os meios de comunicação por aqui, que horas falhavam a conexão, horas ficavam lentos demais.
Meu telefone não parou desde sexta. Chego a falar com o Brasil até 3 vezes por dia, conforme novas notícias vão saindo, no intuito de acalmar a família.
Por aqui estamos bem. Apreensivos mas bem.
Agora vivemos os efeitos da calamidade. Estamos vivendo dias de falsa normalidade.
Já fizemos estoque de arroz, que está sumindo das prateleiras de todos os estabelecimentos, garrafas de água também somem e aumentam o preço. Também enchemos os tanques, pois o combústivel já subiu e vai subir de novo, além do racionamento que vem por aí, os saques nos caixas estão limitados a um x por dia. Em alguns caixas eletrônicos nem o mínimo se pode retirar..
Muitas fábricas pararam. Aqui em casa trabalhamos indiretamente para a Toyota, e tivemos folga segunda e teremos quarta também.
 Só nos resta rezar, ajudar os sobreviventes com doações, acompanhar o noticiário por causa de uma possível contaminação nuclear e aguardar o que vem por aí.
Em silêncio. Para que nossos temores não se tornem realidade depois dos medos expostos, da palavra dita.
Da mesma forma que esse povo tão guerreiro e sofrido por tantas tragédias se comporta. Com uma certa resignação por não poder conter o incontido  e uma paciência tirada não sei da onde.
No próximo post, coloco as fotos.
Obrigada a todos, parentes, amigos próximos ou distantes, conhecidos, que se preocuparam conosco e procuraram de alguma forma ter notícias; seja por telefone, por email, por orkut ou pelo blog.
A medida que as coisas forem acontecendo, vou dando notícias.
Rezem por nós, habitantes dessa terra.
Um beijo

Um comentário:

  1. Silvana, que todas as bençãos de Deus esteja com vcs. Se vc permitir gostaria de publicar seu texto em meu blog. Estou orando por todos. Um beijo.
    Nádia

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